sábado, 14 de março de 2009

Labirinto.

sábado, 14 de março de 2009
A raiva que eu sentia de mim era tão grande que tive vontade de fazer alguma besteira. Por que eu sempre me entregava? Que tipo de mulher eu era? Do tipo das que não sabem dizer um não? Do tipo das falsas, que traem as amigas com seus maridos?
Nolan estava ao meu lado, dormindo. O ódio em mim por tê-lo permitido estar ali só fazia crescer. Eu levantei, estava nua, nem me preocupei em vestir alguma coisa decente, coloquei apenas um casaco comprido e calcei uma bota, pegando minha bolsa saí. Precisava respirar, pensar na minha posição. Meu amante sabia muito sobre mim. Desconfiava da verdade sobre Melissa, sobre minha profissão, sobre tudo. Eu não podia acabar assim, e continuar levando tudo numa boa. Se era para acabar por dignidade, eu teria de sair de sua vida completamente. E isso incluía Nina e tudo a ver com a família Nutz. Chamei um táxi e mandei o taxista ir para o centro da cidade, me deixar em frente a qualquer boate. Decidi que era de um bom entretenimento que eu precisava.
No dia seguinte tinha muito trabalho. Mais de 6 clientes. Já fazia bastante tempo que eu andava pensando em tentar largar Jamie. Naquela noite resolvi ir para um lugar diferente. Era tipo um bordel onde eles aceitavam prostitutas novas que só passavam um dia, para saber se gostavam dali ou não. Se gostassem, poderiam ir trabalhar lá. Se não, não haveria problema. E a sua presença ali era de total sigilo para os cafetões das redondezas.
O lugar era legal, grande, arrumado, chique. Os clientes tinham um nível alto, pelo que eu reparei. Depois de atender a uns três clientes, já estava quase decidida a ir trabalhar ali. Notei um homem elegante entrando no local. Olhava as meninas de cima para baixo, sem dar-lhes importância. Perguntei a uma outra prostituta quem era ele. E fui preenchida por um ódio imenso quando ela me disse quer se tratava de Nolan Nutz, cliente fiel da boate. O homem com quem eu dormia todas as noites não traía a esposa apenas comigo, eu era só mais uma. E, antes de o susto passar, outra silhueta conhecida colocou os pés no bordel, e essa eu sabia bem de quem era. Jamie Jerkoff fora me procurar. O jeito era sair pela porta dos fundos.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Porque parece ser impossível.

domingo, 1 de fevereiro de 2009
A chuva lá fora era tão forte que quase derrubava nosso teto. Eu estava enrolada em um edredon pensando na discussão que tivera com Jamie na noite anterior. Melissa crescia e a cada dia eu ficava mais desnorteada quanto à sua educação. Como matriculá-la em uma escola?
Ouvi um toc-toc da porta, seguido de um "Posso entrar?", que mais me pareceu um sussurro. Era Nolan que, certamente, passava ali para me dar 'boa noite'. Isso era totalmente normal. Todos os dias ele costumava passar em meu quarto. Conversávamos sobre a situação, brigávamos por às vezes um querer parar com tudo e o outro querer continuar. Mas sempre acabávamos na cama. E eu havia decidido tantas vezes pôr um fim em nosso caso. Por respeito à Nina, a mim, aos seus filhos. Mas, mesmo assim, sempre acabávamos na cama. Enroscados assim, naquele mesmo edredon que me esquentava, com medo de Nina bater à porta, com medo de Nina suspeitar e usar a lógica no sumiço temporário e rotineiro do marido. Então eu resolvi, mais uma vez, que encerraria nosso caso naquela noite.
Ele entrou, mesmo sem a minha permissão. Não disse oi, nem nada. Foi logo em direção à minha boca. Muitas vezes ele fazia isso, em todas eu não o recusava. Mas dessa vez impedi que nossos lábios se encostassem pondo os dedos em frente a boca de Nolan, parando-o. "Precisamos conversar."
"AH, lá vem você com essa história outra vez!"
"Mas agora é definitivo, não podemos mais continuar. Nina está sofrendo muito. Isso é muito injusto."
"Ela não é a santa que você imagina, vive criticando você!"
"Não quero saber. Já deu o que tinha que dar. Foi bom enquanto durou, mas já está na hora de acabarmos com isso, e sem último beijo nem nada."
"É isso que você quer?"
"Você sabe que não, Nolan, mas é isso que devemos fazer. Está decidido. Era só isso que eu tinha para dizer. Não diga nada, por favor, retire-se."
Ele não disse nada, imaginei. Mas avançou em mim, derrubando-nos no tapete, prendendo meus braços, calando minha boca com beijos. Eu tentava resistir, quando conseguia falar eu dizia que não, que ele parasse. Entretanto ele não obedecia. Dizia em meu ouvido, ''não resista ao que você também quer". Seu machismo me dava raiva. Ele continuava. Desceu a mão para entre as minhas pernas. Abriu-as. Entrou em mim com seus dedos. Eu tentava gritar. Então ele disse baixinho, "Sei o que fazer para você se entregar". Depois ele desceu me beijando até minhas pernas, com as mãos ele me abria, com os beijos me arrepiava, com os dedos me enlouquecia. E com a língua passou a parar minhas atitudes que tentavam o impedir.
"Nolan, não é só prazer..."
"Mas é isso que nos mantém juntos, Lúcia.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Presentes de Natal.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Quando eu era criança/adolescente passava os natais com a família. Ficávamos ao redor de uma mesa, comendo calados. Quando terminávamos, cada um ia para a sua cama e dormia. Nos meus primeiros anos com Jamie, passei uns comendo ao seu lado em algum restaurante caro, outros comendo sozinha enquanto ele supostamente trabalhava. Desde que comecei a morar sozinha, se não passei o natal com algum cliente, combrando mais caro, é claro, passei sozinha andando por aí.
Esse foi o meu primeiro natal no qual eu ganhei algum presente. Melissa. E mais alguns da família Nutz. De Nina um belo vestido para domingo --', de Maurício um cartão bem enfeitado dizendo "Te adoro tia Lúcia", de Ana nada, ela ainda é muito pequena, e de Nolan, além de seus olhares desejosos quando lhe dou as costas, um vestido de noite vermelho, aparentemente ele espera que um dia eu saia com ele usando-o --'.
Por conta de, às vezes, sentir certa inveja de Nina por tudo que ela conseguiu e eu não, certas horas me sinto superior por ter seu marido como meu admirador. Mas já está passando da conta. Um dia ele até tentou me agarrar quando estávamos sozinhos. Eu quase dei-lhe um tapa, mas no fundo, no fundo eu gostei. Nolan me deseja como mulher, não como prostituta. É isso que me atrai nele.
Disse para Nina que não poderia viajar para passar o Natal com a família por conta do trabalho e que ficaria com ela. Ele disse ter adorado a idéia, mas notei um tiquinho de contrariedade. Talvez ela quisesse ficar sozinha com a família. Juntas, preparamos a ceia enquanto Nolan e Maurício faziam as compras de natal e Melissa e Ana brincavam de boneca. Eu não tirava os olhos de minha sapequinha e por isso quase deixei um bolo queimar.
Depois de todos termos comido e trocado presentes, tirei a mesa e levei a louça para a pia da cozinha. No caminho de volta para a sala, entrei em um banheiro e encontrei nina enconstada na pia, chorando. Fechei a porta e tentei conversar com ela, tentei fazer com que ela me explicasse o motivo do choro. E depois de uns 20 minutos ela explicou. Seu casamento estava em decadência e ela não sabia o que fazer para dar vida de novo a tudo. Nolan não a olhava mais como mulher, só como mãe dos seus filhos. Eles brigavam bastante antes de dormir e ele não dava-lhe mais carinho. Senti um grande peso na consciência ao ouvir aquilo. Conversamos um pouco, eu disse para ela que era fase, ela parou de chorar depois de um tempo e foi lavar os pratos. De madrugada, quando todos dormiam... Nolan foi ao meu quarto dar o meu verdadeiro presente... me beijou, me deitou e eu não resisti. Esse foi o presente que dei à Nina, a nunca fora de moda traição.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Hoje a palavra 'mudança' teve vários significados para mim.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
Ando tão confusa ultimamente. Não sei o que faço quanto à Melissa. Quem vai cuidar dela enquanto eu estiver no trabalho? Será que é justo com ela criá-la? Como ela vai se sentir quando tiver consciência de que sua 'mãe' é uma prostituta? E quanto às leis... Eu preciso ter a guarda da menina... até para matriculá-la em uma escola será difícil. Mas o meu amor, o meu amor... não permite de jeito nenhum afastá-la de mim. Ao ver Melissa em meus braços, pela primeira vez na vida, senti que algo ou alguém, no fundo, pelo menos, quer minha felicidade. E isso me comove, e isso me dá mais vontade de criar essa ruivinha que parece ter sido trazida por uma cegonha.
Peguei minhas coisas e fui embora com 'minha filha' hoje, mais cedo. Dona Neyde me viu, "Bom dia querida! Quem é essa princesinha?", "Bom dia, dona Neyde!, Essa é Mel, filha de uma amiga que está no Exterior. Estou cuidando dela para Sarah, minha amiga". "Ah sim, mas você está de mudança?", "É, vou para a casa de minha mãe. Ela me ajudará a cuidar de Melissa".
Fui no carro do frete com Mel para a casa de Nina. Admito que estava muito nervosa em fazer isso. Chegar assim, sem avisar. E ter que contar mentiras e mentiras para desviar os verdadeiros fatos sobre Melissa, e fingir que vou organizar festas, quando na verdade vou ficar de quatro para alguém. Mas tudo vale a pena quando vejo os olhinhos claros da menina fecharem-se no meu colo, tranqüilos e seguros.
Nina me recebeu bem. Contou-me que resolvera passar mais uns 3 meses na cidade e a minha presença seria muito prazerosa. Sempre prazerosa :x Conheci seu marido, Nolan... e isso foi mais um problema para mim. Nolan era alto, cabelos castanhos, sorriso brilhante e com um olhar sexy. Ele me fez sentir uma atração antiga, dos tempos que eu me interessava por homens os quais não sabiam que para ouvir meus gemidos precisavam pagar. Ele me olhou de um jeito estranho. Ele me olhou fixamente. Ele me olhou bastante. Eu desviei o olhar e expliquei à Nina que a mãe de Melissa estava no exterior e que por enquanto a menina precisaria ficar comigo.
Nosso quarto, meu e de Mel, ficava ao lado do quarto do casal.
Eu dormi na distração de ver a pequena ruiva pegar num sono à minha frente.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Às vezes acontecem coisas que me fazem acreditar em Deus.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
Sempre fui estranha. Acho que a solidão, com a qual eu já nasci, dava-me esse ar diferente. Sempre reprimi meus sonhos, abafei meus mais profundos desejos, sempre me recriminei e me proibi de lutar por alguma vontade. Talvez porque tentar me fizesse perder tempo e eu não sou nenhuma perua rica com dinheiro para isso. Ou porque o medo de ser uma fracassada me paralisa e me tira qualquer coragem. Mas apesar de não buscar a conquista de minhas necessidades, sempre alimentei uma esperança, como uma sementinha a qual eu rego na crença de que um dia, talvez, ela se torne uma grande árvore.
Uma vez por mês eu visito um orfanato. Sempre quis ser mãe, como já falei várias vezes aqui. Ao chegar lá sou tomada por um sentimento diferente, mas já estou acostumada. Uma coisa metade sonho, metade fracasso. Metade meta, metade ilusão. Em meus olhos sinto um brilho de quem diz, “ainda vai chegar a minha vez”. Mas eu sinto um arrepio gritante. Ele me sussurra no ouvido de um modo frio que eu não sou o tipo de gente que merece uma criança, que é digna de dar amor e educar alguém. Eu vejo a luta constante dessas duas sensações. Travam batalhas quase intermináveis dentro de mim, tendo como vítima de sua guerra o meu sofrimento, a minha agonia, a minha angústia.
Algumas crianças do orfanato já me conhecem e me chamam de tia Lúcia. Fico horas e horas pensando no sofrimento daquelas pessoinhas. Na vontade de ter alguém. Na vontade de ter um lar. Mas crianças são crianças. Por mais que o sofrimento seja grande, quase sempre as encontramos rindo e brincando.
Sempre que possível eu levo alguns presentinhos. Coisas simples, mas que fazem surgir naqueles olhinhos curiosos um grande brilho de felicidade. Há uma garotinha lá chamada Jéssica. Sinceramente, é a minha preferida. Uma mocinha com seus cinco anos de idade muito bem aproveitados, que se acha muito esperta (e que é), brincalhona e extrovertida. Uma garotinha pequena no tamanho, mas grande no ser. É ela que eu tenho mais vontade de adotar. Já perdi (ou ganhei) dias imaginando Jéssica em minha vida. Nós duas na praia, tomando sol. Nós duas viajando, olhando a paisagem. Nós duas na cozinha, preparando o jantar. Nós duas no shopping, fazendo compras. Nisso lágrimas já me subiram nos olhos, e já me desceram de lá diversas vezes.
A meninha me deixa feliz, só por existir. Parece que seus pais biológicos foram assassinados por uma questão de drogas. Jéssica fica ali, branquinha dos cabelos negros, pulando e sendo feliz como quem já nasceu naquele lugar e não busca saber a verdade sobre suas raízes. Ainda não, com seus cinco aninhos de idade. Olhando para ela sinto cada vez uma vontade maior de ser mãe. Imagina você... alguma assistente social ceder a guarda de uma criança para uma prostituta solitária. Isso destrói qualquer sementinha.
Mas ontem algo me aconteceu, algo inacreditável. Como se alguém soubesse dos meus sonhos e quisesse a minha felicidade. Como se eu fosse protagonista de uma novela mexicana. Ontem... uma criança foi deixada à minha porta. Ela deve ter uns dois anos e meio. É uma menina, uma menina ruivinha e chorona. Estava dormindo em um cobertor rasgado, e, como que de um modo muito clichê, tinha uma carta amarrada em seu punho. Onde dizia claramente: “Cuide dela como se fosse sua. Para você é um presente, para mim um alívio”. A carta não tinha assinatura. Não dizia o nome da menina. Mas embaixo, dentro do envelope ainda, estava sua certidão de nascimento. E um ‘P.S.’, pedindo para eu não ir atrás da mãe, pelo nome contido no documento. Afirmando não ter nem tempo, nem amor, nem dinheiro para cuidar de Melissa. Melissa era o nome do meu sonho entregue a domicílio.
Ela está ali, deitadinha. Só não chora quando dormi mesmo. Os vizinhos devem estar achando estranho. Pode ser que eles denunciem para alguém. Não sei o que fazer. Se a levo para um orfanato. Se cuido dela como minha filha. Acho que vou me mudar daqui com Melissa, para evitar qualquer tentativa de corromper meu primeiro sonho realizado.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Um encontro com o passado.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Uma folha em branco, um convite. Um Sol nascendo, um convite. Uma cama bagunçada, um convite. O que mais é um convite para você?
Saí para passear como quem nada queria. Fazia tempo que eu não gastava minhas manhãs pelas ruas secas de minha cidade.
Meus vizinhos sabem como eu ganho meu dinheiro, então, pelo instinto de se preservarem, não falam comigo. Há apenas uma senhora, sem filhos, netos, sem ninguém. Ela mora em um apartamento de 4 quartos, cujo andar é em cima do meu. Meu apartamento é pequeno. Tem dois quartos, um para eu dormir, outro onde eu entulho coisas que não uso mais. Essa senhora, dona Neyde, só não é mais sozinha por que deve ter uns 20 gatos em sua casa. Todos com seus nomezinhos e corezinhas enfeitando o lugar. E que lugar! Lugar belo para se morar, principalmente com uma família. Com uns três filhos, um marido, um papagaio... enfim, daria para construir uma vida maravilhosa ali. Dona Neyde, não sei por que, era a única moradora de nosso prédio que falava comigo. Talvez seja por que temos a solidão como algo em comum. Talvez seja porque ela possa não saber quem realmente sou. Talvez seu coração seja doce e ela me aceite mesmo assim. E é a única, também não sei por que, para quem falei meu nome verdadeiro. Desci com uma roupa decente, encontrei com ela na portaria e ela me cumprimentou com aquele sorriso e olhos tão meigos e com um de seus gatos no colo, a quem chamava de ‘roqui’.
Fui andando lentamente pela rua, tomando um sorvete de chiclete, sorrindo. Parei em uma praça, não muito movimentada devido ao horário. Sentei-me em um banco e fiquei observando as crianças brincarem. Uma das mães que se encontrava em uma roda de outras mulheres me viu e logo em seguida pegou seu filho pela mão e foi embora com ele. Depois disso, outras três fizeram a mesma coisa. Sinceramente, já faz muito tempo que eu me acostumei a esse tipo de recpção.
Outra mulher chegou, com uma menina nos braços ela passeava cantarolando uma música infantil. De olhos fechados, ela passava a mão com uma aliança chamativa sobre os loiros cabelos da criança. Sentou-se ao meu lado e me cumprimentou. No mesmo instante a reconheci. Era Nina Nutz, estudamos juntas durante muitos anos, antes de eu fugir de casa. Não sei se meus pais disseram lá que eu fui embora. A princípio, não gostei de vê-la ali. Éramos ‘inimigas’ em nosso tempo de colégio. Namorávamos os garotos mais populares, andávamos com as pessoas mais legais. E nos odiávamos. Agora a via ali à minha frente. Linda, aparentemente rica, casada e mãe de uma bela filha. Tudo o que eu queria ter e ser. Tudo que eu poderia ter e ser se tivesse continuado no meu caminho. Se não tivesse me desviado. E, talvez, se não tivesse conhecido Jerkoff. Nina também se lembrou de mim, mas parecia não ligar para o fato de termos sidos inimigas durante anos. Demonstrava ser madura.
Ela me perguntou como andava a vida, se eu tinha me casado, se tinha filhos. Eu tive que inventar uma história, mentir que estava trabalhando em uma empresa de festas, dizer que não me casei por que não quis casar. Nunca que eu falaria a verdade, seria humilhante. Por horas conversamos. Ela me falou de seu marido, Nolan, de seus dois filhos, Maurício e Ana, a loirinha. Rimos bastante de nosso passado juntas. Não lembramos por que não nos gostávamos, afinal, tínhamos tudo a ver uma com a outra. Ela disse que eu me tornara uma linda mulher, mal sabia ela que isso era o meu instrumento de trabalho.
Senti bastante inveja de Nina, admito, e ela ainda me lembrava a época de que eu queria esquecer, mas fazia tempo que eu não conversava com alguém assim, de igual para igual. Sem me sentir inferior ou submissa. Alguém que não me julgasse, que não me recriminasse. Alguém que me fizesse me sentir bem. Ficamos amigas incrivelmente. Ela me convidou para passar uns dias em sua casa, na minha antiga cidade. Estava passando férias aqui e disse que foi muito bom ter me reencontrado, que não queria que perdêssemos o contato. Eu disse que iria pensar. Trocamos telefones.
Sinto-me muito solitária, todos os dias. Talvez a cada dia me sinta mais. Porém hoje senti um sentimento diferente. Era uma inveja, misturada com saudade, temperada com felicidade, recheada com mais e mais solidão. Juro que eu queria fazer algo igual amanhã.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

A sempre presente nostalgia.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008
Por mais que ver todos os dias a mesma pornografia nojenta e a usura do seu corpo como material de prazer seja sempre igual, não dá para se acostumar e ser indiferente a essa realidade. Eu preciso sempre ser forte, ser firme, ser fria. Eu preciso sempre manter em mim um sentimento de nostalgia, e pensar que pelo menos nem sempre foi assim.
Quando eu fugi de casa, achava que minha vida iria melhorar. Claro, se não para que faria isso? Mas logo essa doce ilusão tão certa se transformou em um sonho distante e a minha realidade se fixou na vida difícil de uma mulher solitária.
Eu me lembro que estava perdida. Não sabia o que fazer. Não tinha para onde ir. Até conhecer o maldito Jamie Jerkoff. Um homem magro, de meia idade e com cara de safado e de aproveitador. Mas naquela idade eu não tinha essa mesma concepção, via-o como um homem bondoso que se oferecera para me acolher em sua não tão humilde casinha de uns quinhentos salários mínimos. Ele me encontrou na rua, com fome, frio e sem ninguém. Levou-me ‘caridosamente’ para lá. No começo me senti muito feliz. Achei que todos os meus problemas estavam resolvidos e que aquele bom e rico homem sem filhos iria me dar uma vida decente. Ganhei um quarto, ganhei alimentação, ganhei estudo, ganhei atenção. Realmente estava tudo perfeito, mas constantemente eu via olhares safados e suspeitos de Jamie para mim. Principalmente quando eu estava na piscina, ou quando saía do banho. Naquele tempo eu não sabia no que ele trabalhava. O que me foi dito foi apenas que ele era dono de um certo local de diversão. Certa madrugada, ele chegou do seu trabalho e eu estava vendo tevê no seu quarto. Eu tinha liberdade ali. Estava usando um pijama infantil demais para meus 15 anos e me debruçava sobre seus quilos de travesseiros de pena de ganso, olhando fixamente para o filme a minha frente. Jamie chegou, despiu-se e deitou ao meu lado, dizendo que iria assistir ao filme comigo. De pouco em pouco, ele se aproximava mais. Passava os dedos levemente pelas minhas costas e me olhava sem parar. Eu estava achando aquilo bom, afinal, não tinha pensamentos maldosos quanto a ele. Até a hora que ele desligou a televisão e foi para cima de mim. Eu não estava entendendo nada, mas não era tão inocente assim. Ele estava deitado por cima de mim e forçava minhas pernas para os lados com as suas, enquanto afastava minha roupa com as mãos. “O que você está fazendo, Jamie? Enlouqueceu?”, eu perguntava. “Já está na hora de virar uma mulher”, ele respondia. Foi assim, confusa, com dor e com medo que perdi a minha virgindade.
Nos dias que se seguiram, eu não soube o que fazer. Ele ia todas as noites até o meu quarto, cheirava-me e me deitava com violência na cama. “Esse seu corpinho de menina me deixa louco”, ele dizia. Comecei a achar aquilo normal. Passei a pensar que gostava dele, que gostava de transar com ele. Em minha cabeça nós formávamos um casal e estávamos iniciando uma vida sexual muito excitante. Comecei a querer aquilo, a esperá-lo em meu quarto todas as noites. Em preparar surpresas para ele. Pedi alguns filmes pornôs, para saber como dar-lhe mais prazer. Ele me deu, adorando a idéia. Dizia que eu tinha vocação para dar, e que ele já não conseguia dormir sem me invadir completamente antes.
Mas a relação não foi um mar de rosas. Comecei a achar que éramos compromissados. Quando ele voltava mais tarde ou viajava eu pedia explicações, o que rendia muitas brigas violentas entre nós. Às vezes ele até me batia, cansado de me dizer que eu nada tinha a ver com aquilo, o que começava com raiva e acabava em sexo, uma vez que isso sempre me excitava. Mas eu fui crescendo, fui entendendo que era só questão de desejo. Fui percebendo no que ele trabalhava. Fui vendo que logo seria a minha vez. Compreendi que se eu não desse para ele, ele me expulsaria de casa. Aí, de certa forma, eu já era uma prostituta. Livre para ir embora, mas sabendo o que me esperaria se eu fosse.
Ficamos nisso até eu completar 18 anos. Nesse dia ele disse que ia me levar para conhecer seu trabalho como presente de aniversário. Chegando lá tirei todas as minhas dúvidas, vendo mulheres semi-nuas dançando em mesas com ferros no centro. Ele me levou para um quarto e foi muito sincero comigo. Jamie me comeu mais uma vez e depois disse, acendendo um charuto: “Agora você vai pagar em dinheiro por tudo que eu lhe dei. Agora você tem a chance de me retribuir. Agora você trabalha para mim”. Nesse dia eu passei de prostituta por opção para prostituta por necessidade.
O meu luxo em sua casa diminuiu. Todo dinheiro que eu recebia ficava com Jamie. Quando eu completei 21 anos ele, que já havia enjoado de mim, mandou-me arrumar um lugar para morar e começou a me pagar como uma das putas de seu bordel. Eu não tinha para onde correr. Era só transar o que eu sabia fazer.
Hoje finjo gratidão para com ele, mas se eu tivesse oportunidade de cravar-lhe uma faca nas costas, não desperdiçaria. Se eu pudesse castrá-lo iria adorar, mesmo que isso me custasse alguns aninhos sem liberdade. O que não seria nada, comparado ao trauma que ele já me proporcionara e a tudo que ele fez para me corromper. Mas a pessoa fria que eu me tornei com tantas experiências me faz esperar pelo momento certo de me vingar.
 
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